A manhã do segundo dia (16/9) do IV Encontro Maranhense de Agroecologia foi marcada por intercâmbios e vivências em comunidades agroecológicas e territórios tradicionais. A ideia foi compreender como a relação de cuidado e pertencimento com a terra, por meio do sistema agroecológico, é um instrumento de resistência e enfrentamento contra os grandes empreendimentos e o agronegócio. Foram visitados o projeto Tapera Viva e as comunidades tradicionais do Cajueiro e Taim, na zona rural de São Luís.
O sítio agroecológico Tapera Viva, localizado na comunidade Quinta, em São José de Ribamar, é uma iniciativa de conexão com a terra e a produção saudável de alimentos por meio da construção de agroecossistemas ecologicamente equilibrados. “A nossa missão é cuidar da terra, do solo e produzir vida. A gente olha pra tudo o que há ao nosso redor como conexões, entendendo a função de cada organismo que vem para a nossa horta, ao invés de só aplicar algum tipo de veneno. Compreender e aproveitar o conhecimento e função que eles nos traz e aplicar na nossa atividade agrícola”, nos conta Taiguara dos Santos, integrante da família Tapera Viva.
Dentre a produção da família estão hortaliças, frutas, condimentos, alface, rúcula, milho, macaxeira, abóbora, banana, mamão, entre outros. “Essa experiência foi muito agradável, aprendi muito sobre o modo deles trabalharem. Fazendo a cobertura das folhagens nos canteiros, aproveitando os troncos de bananeira, achei muito interessante. Vou levar muito aprendizado para espalhar para minha comunidade”, Gersina Lopes, agricultora da comunidade Claridade, São Luís Gonzaga.
No dia 8/12 será a primeira vivência pedagógica para crianças voltada para a agroecologia e o brincar livre. O intuito é despertar percepções e aprendizados por meio do som, do cheiro e do tato com a terra. “Pensar no cuidado da terra, é pensar no cuidado de nossas crianças. A revolução será dos nossos filhos. Educá-las para que dêem continuidade a esse caminho que estamos trilhando”, reflete Júlia Monteiro, parceira do Tapera e também do território quilombola criativo Casulo Amarelo.
Cajueiro é um lugar de árvores na ilha de Upaon-Açu (São Luís). Árvore frutífera, que além de caju, brota outras vidas que pulsam por justiça, como por exemplo, as famílias, que têm sido atravessadas por grandes projetos do dito desenvolvimento. Lugar que ainda o verde e as demais cores da ilha insistem em florescer. A luta no território Cajueiro é pela permanência nele.
Entre as saídas os encontros de reexistências em territórios e resiliência às mudanças climáticas em São Luís, a parada em Cajueiro foi uma delas. A vivência foi no espaço da União de Moradores de Cajueiro. A prosa foi conduzida pelos moradores Davi Sá e Lucilene Costa. Ambos compartilharam sobre como Cajueiro vem resistindo e enfrentando o descaso da Justiça e a pressão política e econômica exercida pelas empresas com grandes interesses pela área, em especial, a instalação do Porto São Luís em parceria com o Governo Estadual.
“Aqui tinha um grande babaçual. Mais de 5 mil palmeiras de babaçu foram abaixo. 24 casas foram derrubadas de forma forçada. Para a justiça e governo, as vidas valem menos que toda essa especulação imobiliária e os interesses dessas empresas”, enfatiza Davi, ao relatar algumas violações que foram levadas para o Tribunal Permanente dos Povos, e lamentar por todas as ações que são emperradas pelo judiciário, dando tempo para o avanço nos investimentos do agronegócio na região.
“Só quem sabe é quem está dentro da história. Nós moradores de Cajueiro sabemos que tudo isso são estratégias para nos desmobilizar, nos fazer desistir e nos colocar uns contra os outros. Mas isso não vai me fazer desistir de ser resistência e de ser defensora da vida, do brincar dos meus netos no balanço e do tempo natural das coisas”, afirma Lucilene Costa, moradora de Cajueiro.
Na roda de conversa entre os moradores e visitantes, vivenciamos a defesa do Bem Viver e nos indignamos com as violações sofridas pelas famílias e pela natureza. “Mais de 5 mil palmeiras de babaçu foram derrubadas em Cajueiro. Vidas foram mortas aqui. Porque as palmeiras são nossas irmãs. Somos filhas da mesma mãe Terra. Quando derruba uma é como se matasse a gente”, lamenta Vicença Alves, da União das Associações das Escolas Famílias Agrícolas do Maranhão, após a escuta das falas de Davi Sá e dona Lucilene Costa.
Da mesma sorte, a comunidade de Taim, também localizada próximo ao Complexo Portuário do Itaqui, é uma rica reserva de recursos naturais. Há mais de 40 anos, a comunidade vem sofrendo com a instalação de grandes projetos de desenvolvimento econômico como empresas multinacionais de mineração, de fertilizantes e produtoras de grãos e soja. Aos olhos de quem visita Taim, é perceptível as grandes crateras, elevados barrancos e paisagens cinzentas ocasionados por grandes e pesadas máquinas e estruturas no meio da mata e do manguezal.
“A gente vive e resiste aqui no meio do furacão, por causa de um desenvolvimento, que assola, maltrata e degrada nosso povo, nosso território. Antes, era tudo abundante aqui. Tínhamos uma diversidade de peixes, mariscos, plantas, caças e animais. Além da natureza, nossa forma de se alimentar foi também impactada. Tudo isso foi causado pelo capital e pelo agronegócio”, enfatizou uma das lideranças comunitárias de Taim, Francivania Gonçalves.
Toda essa situação de Taim não só altera drasticamente a paisagem física, geográfica e natural da comunidade, mas também muda e implica no modo de vida dessas pessoas, na sua ancestralidade com o território e nos seus laços sociais e afetivos com aquele lugar, além da ameaça constante de realocações das famílias.