GT das Juventudes Rurais do Bico do Papagaio realiza Encontro de Avaliação e Planejamento para 2023

Atividades proporcionaram debates sobre organização de jovens como lideranças, necessidade de engajamento no campo, conquista de autonomia e troca de experiências sobre vivências na zona rural.

Texto: Letícia Queiroz

Os jovens se reuniram em comunidade quilombola para planejar atividades. Foto: Letícia Queiroz.

O Grupo de Trabalho (GT) das Juventudes Rurais do Bico do Papagaio promoveu, nos dias 2, 3, 4 e 5 de fevereiro o Encontro de Avaliação e Planejamento para o ano de 2023. O evento aconteceu na comunidade quilombola Ciriaco, em Esperantina (TO). Nos quatro dias de atividades, cerca de 30 jovens quilombolas, assentados, acampados, quebradeiras de coco e artesãos de várias cidades da região compartilharam experiências sobre suas vivências no campo e na luta nos territórios.

Apoiado pela Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins (APA-TO), o Encontro teve como objetivo ampliar os espaços de participação e protagonismo das juventudes e aproximar e reforçar os laços entre os jovens que se reconhecem como atuais ou futuras lideranças de suas comunidades, além de destacar a importância da comunicação no campo.

Em vários momentos, as juventudes ressaltaram a importância de sonhar e buscar uma vida digna para as famílias sem a necessidade de sair do campo. Relatos sobre dificuldades de viver na zona rural, sempre acompanhados da vontade de permanecer nos territórios, foram compartilhados durante as atividades.

Os jovens também discutiram temas como: opressão contra os povos tradicionais; união pelo direito à vida; questões de gênero; comunicação no campo; combate à LGBTfobia; luta de classe; direito à educação e lazer; êxodo rural; falta de infraestrutura; ameaças por causa de territórios; agroecologia; cultura popular; geração de renda; preservação do meio ambiente; entre outros.

Experiência na Casa de Farinha

No primeiro dia de encontro, antes das atividades programadas, os jovens socializaram e começaram a entender mais sobre a realidade de outras comunidades. Ainda durante a viagem e nos momentos de descontração no local do evento, algumas pessoas que não se conheciam começaram a formar vínculos e a participar de rodas de conversa.

Com as atividades dentro de uma comunidade quilombola, os jovens trocaram conhecimentos adquiridos no campo com os moradores do quilombo e visitaram a casa de farinha do senhor Francisco. No local, fizeram perguntas relacionadas à fabricação do produto, tiraram dúvidas sobre o processo – desde o plantio da mandioca até a comercialização do produto -, e sobre os desafios e objetivos da produção.

A troca de conhecimento no intercâmbio cultural foi percebida diariamente. Assim como o senhor Francisco ensinou sobre as etapas da fabricação da farinha, ele aprendeu com o jovem Jorge Luis Ruberto Lima a fazer uma palha trançada.

O jovem, que é membro do GT e do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), conta que aprendeu ainda criança a fazer artesanato com palhas de palmeiras., conta que aprendeu ainda criança a fazer artesanato com palhas de palmeiras. “Eu cresci vendo meus avós e parentes usando utensílios de palha do babaçu e nós, quando crianças, tínhamos o costume de construir brinquedos de palha, tipo caixa de segredo e relógios… Lá no encontro eu ensinei o seu Francisco a produzir uma palha trançada, que eu aprendi a fazer brincando, pois eu via como meu vô trançava a esteira e o abano”, conta.

Com as experiências, o jovem voltou do encontro mais fortalecido. “Eu acredito que é muito importante a gente fortalecer o diálogo intergeracional, pois quando se fala em organização e luta das juventudes, precisamos aprender também como foram as histórias de luta de quem veio antes de nós”, finaliza Jorge.

Permanência da juventude rural no campo

No segundo dia de evento (3) começaram as ações planejadas pelo GT das Juventudes. Após as apresentações culturais, todos se apresentaram e participaram das atividades previstas. Em grupos, eles se organizaram para discutir aspectos políticos, incluindo a importância da saída do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e retorno de Lula (PT) para a sobrevivência dos camponeses.

Uma das atividades de destaque do segundo dia foi a elaboração de cartazes contendo características das comunidades de cada integrante do grupo participante do Encontro. Com colagens, pinturas, desenhos criativos e elementos da natureza, os jovens fizeram quadros que comunicavam os pontos positivos e negativos dos lugares onde vivem.

Uns dos principais problemas apontados foram as péssimas condições das estradas rurais e o medo de invasões por parte de grandes fazendeiros. Tais apontamentos resultam em um grande problema: a dificuldade para a permanência da juventude rural no campo.

Planejamento e ação

Camilla Ferreira Holanda tem 19 anos e integra o GT das Juventudes desde 2019. Ela explica que a agroecologia e a agricultura familiar estão entre os principais pontos focais dentro do GT. “São temas importantes. O jovem tem que saber que ele tem espaço para ocupar. Só precisamos fazer acontecer. A gente trabalha com esses temas porque os jovens rurais precisam desse reconhecimento. Sabemos como é difícil ser jovem, preto, classe baixa… Então a gente traz essa visibilidade e mostra a força que temos, mostrando a importância de estarmos no campo”, pontua.

Segundo a jovem, para 2023 e os próximos anos, as juventudes podem esperar mais interação e ações para o fortalecimento dentro das comunidades. “O GT tem como um dos principais objetivos continuar esse trabalho com a juventude. Ainda estamos fazendo o planejamento para os próximos anos, mas vamos continuar fortalecendo a juventude, trazendo novos temas e novos assuntos para serem abordados. Vamos trabalhar muito a questão de produção e renda, trazer projetos para a juventude, encaixá-los nos movimentos sociais, mostrar que a juventude tem espaço, voz e vez”, ressaltou Camila.

O jovem Tonny Evangelista Lopes participou de um encontro do GT das Juventudes pela primeira vez após conhecer o grupo em uma rede social. Ele, que mora na Vila Dezesseis, município de Augustinópolis (TO), conta que saiu do encontro mais empoderado e entendendo mais sobre a luta e necessidade da atuação dos jovens no campo.

“Eu não conhecia o GT. Conheci através do Instagram e fiquei muito curioso quando recebi o convite. Quando cheguei lá na comunidade fiquei surpreendido ao ver que são jovens comunicadores que formam o GT. Aprendi sobre agroecologia, diferentes formas de cultura, de trabalho, as histórias de luta de cada comunidade e as superações emocionantes”, destaca.

Entusiasmado, Tonny afirma que já é presença confirmada nas próximas reuniões. “Foram quatro dias de muito aprendizado. Saí realizado e esperando ansiosamente para o próximo encontro”, destaca.

Avaliação

O grupo, que tem como foco a sustentabilidade e a não-aplicação de agrotóxico na produção, acredita que encontros como este servem, também, para avaliar a caminhada e extrair aprendizados do processo de organização das juventudes.

Para Yuki Ishii, Coordenadora do Projeto Juventudes Rurais e Agroecologia em Rede no Território do Bico do Papagaio/APA-TO, no encontro foi possível permitir a interação dos diferentes olhares sobre o que é o GT entre os membros atuais com os que estão chegando agora. “A avaliação contribuiu para o GT poder pensar na sua caminhada futura, ter clareza de quais as estratégias devem ser adotadas para a avançar na organização e no fortalecimento do protagonismo juvenil na região do Bico do Papagaio”, explicou.

Segundo ela, o encontro também foi um espaço de formação para os jovens e as jovens, “contribuindo cada vez mais para a conquista da plena autonomia do GT das Juventudes em coordenar os seus próprios processos de planejamento, além de evidenciar o quanto o GT evoluiu e amadureceu organizacionalmente e politicamente ao longo de sua caminhada”.