Francisca Pereira Vieira chegou na comunidade Ouro Verde, em Araguatins, no estado do Tocantins, quando tinha 36 anos de idade. Este ano, ela completou 70 primaveras. Não é preciso nem dizer, então, que se tem alguém que conhece bem a história da região, essa pessoa é a Dona Francisca. Morando e trabalhando há 34 anos no mesmo lugar, ela já viu muita coisa mudar. E uma das mudanças mais importantes na vida dela foi a conquista da terra. Junto com a família e com outros companheiros e companheiras de luta, contando sempre com o apoio de sindicatos e movimentos sociais, Dona Francisca e seu esposo Espedito resistiu e persistiu muito até a área onde ela vive hoje ter sido demarcada e regularizada.
Porém, não foram apenas transformações alegres que a Francisca vivenciou. Mesmo estando em um lugar privilegiado, entre os rios Araguaia e Tocantins, algo que sempre foi uma dificuldade, e que vem se complicando cada vez mais, é o acesso à água. Além das alterações no curso dos rios trazidas pela construção de barragens, a distribuição da água é desigual, então grandes fazendeiros e pessoas que têm mais dinheiro, conseguem água com mais facilidade do que pequenos agricultores. E ela sabe que não é só no campo que existe esse apuro. Na cidade, a água é privatizada e custa caro ter acesso a esse recurso.
Mas como a própria Dona Francisca diz sobre sua família e comunidade, “nós somos persistentes na história”. Portanto, ela não podia ficar de braços cruzados e tinha que arranjar um jeito de melhorar a situação, porque caminhar 17km para poder buscar água sempre que precisasse estava se tornando cansativo e exigente demais.
A primeira alternativa encontrada pela Francisca foi construir um poço, que garantiu um pouco mais de água para poder regar as plantas. Mas como a água que vem do poço é salobra, a maior parte do problema ainda não tinha sido resolvida, porque não dava para consumir a água, nem lavar roupa ou dar de beber aos animais. Foi somente em 2015 que a solução chegou de verdade: uma cisterna!
“Nós tivemos duas conquistas que a gente vai morrer e não vai esquecer: uma foi a terra e a outra foi a cisterna”.
Por essa fala da Dona Francisca, dá para perceber bem o valor que essa alternativa tão simples e eficaz tem para a vida dela e da família.
A cisterna foi adquirida com a ajuda da APA-TO (Alternativas para a Pequena Agricultura no Tocantins), através do Programa ECOFORTE. Como havia mais de uma família que iria receber a cisterna, perceberam que seria importante haver um curso que ensinasse o passo-a-passo da construção e foi na casa da Francisca que esse curso aconteceu, capacitando muitas famílias de dentro e até mesmo de fora da comunidade. Depois de uma semana limpando a área, cavando o buraco e produzindo as placas, a cisterna pôde finalmente ser usada.
Quanta coisa boa aconteceu de lá pra cá! Além da água da cisterna já ser bem limpinha, a Dona Francisca ainda faz um tratamento com cloro que tira todas as bactérias e deixa a água prontinha para ser consumida. Se antes, quando a família ia visitar, era sempre uma preocupação o abastecimento de água, hoje isso já não esquenta mais a cabeça de ninguém, porque sabem que tem água para todo mundo. E como a cisterna armazena a água que vem da chuva, não é preciso tirar nenhum dinheirinho do bolso. Agora, tem água suficiente para cozinhar os alimentos, beber, lavar as roupas, fazer tudo o que antes dava muito mais trabalho para fazer. Porém, mesmo tendo água em abundância, ela e a família sabem bem da importância de preservar esse recurso e por isso sempre usam com cuidado e nunca desperdiçam.
Os benefícios trazidos pela cisterna foram tantos que trouxeram muitos sonhos para o coração da Dona Francisca. Ela quer desenvolver um sistema de irrigação que faça a água da cisterna chegar diretamente aos pés de cana, cajá, alface, rúcula, gengibre, mamão, açaí, maxixe e pepino que ela tem na horta. Quando realizar esse sonho, ela sabe que vai ficar ainda melhor, porque não vai ser mais necessário a água no balde e vai trazer ainda mais tranquilidade para a vida dela e da família. Mas ela não sonha apenas para si ou para a própria família.
Dona Francisca também gostaria muito que outras pessoas da comunidade tivessem acesso a alternativas como a cisterna, para que pudessem viver com mais saúde e qualidade de vida, e sabe que, para esse sonho se tornar realidade, algo essencial é o compromisso dos nossos governantes com a vida do povo. Além de tudo isso, ela ainda deixa o recado: “o que a gente tem que fazer é preservar o que a gente conquistou, multiplicar e lutar por outras coisas”. Sigamos o conselho de Dona Francisca.
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